Visto, mudança e decisões: como um processo burocrático se tornou uma grande demonstração de carinho

“Mas como assim, você não estava no Japão?” – vocês podem se perguntar. A bem da verdade é que, entre tantas idas e vindas, nem amigos próximos e parentes sabiam onde eu estava. Depois de passar esses últimos anos lá e cá (e, às vezes, acolá), me bateu uma vontade de me fixar em um lugar. A decisão por Tóquio, que pode parecer óbvia para muita gente, foi, na verdade, tomada depois de um intenso processo.

Para quem é novato nas minhas redes ou para quem já se perdeu na ordem dos fatos, vamos a uma recapitulação: morei durante um ano em Tóquio entre 2013 e 2014, e estive de volta ao país para passar temporadas mais curtas (de dois a três meses) em 2016, 2017 e 2018, já tendo como foco a produção de conteúdo aqui para o blog.

No entanto, essa última estada de setembro a novembro do ano passado foi diferente. Continuei produzindo materiais, visitando lugares, conhecendo histórias e encontrando pessoas – mas meu foco mesmo foi buscar algo que não sabia exatamente o que era. Tóquio tem essa fama de cidade caótica, mas, para mim, é um lugar que me traz novas reflexões sobre a vida e me faz entender questões pessoais.

Assim que cheguei, fui encontrar meu querido amigo e parceiro de trabalho Roberto Maxwell. Entre um sushi e outro, eis que ele levanta uma possibilidade: por que não tirar um visto de residente para poder ficar um tempo prolongado no Japão?

Por que não?

Ele me ajudou a levantar os pré-requisitos para o meu caso e percebi que seria surpreendentemente plausível mudar meu visto de turista para um visto de residente, sendo descendente de japoneses. Esse foi o início de um dos processos mais importantes e intensos da minha vida.

Muito mais do que enfrentar a burocracia de reunir documentos, conseguir traduções e compilar justificativas, dar entrada no visto foi uma forma de me atentar a tudo o que havia construído nos últimos 5 anos e meio, desde a minha primeira vinda como aluna de uma escola de japonês. Mais do que pensar em trabalhos e projetos, me refiro à construção de vínculos pessoais, de amizades, de uma rede incrível de apoio e suporte.

Não foram poucas as pessoas que me ajudaram nesse processo. Tiveram os amigos que me ajudaram com tradução, outros que me enviaram modelos de documentos, familiares dispostos a providenciar uma papelada bem chatinha na prefeitura, pessoas próximas que se ofereceram para ser meus garantidores (uma espécie de fiador – sim, aquela palavrinha que assusta muita gente), fora todos os outros que torceram. E muito. A cada palavra de apoio, eu tinha vontade de chorar porque sentia que era realmente genuíno o desejo dessas pessoas de que eu ficasse no Japão.

Toda essa manifestação de carinho se deu num momento de extrema importância. Após o término de um longo relacionamento que teve Tóquio como berço e pano de fundo, precisei ressignificar o que o Japão era para mim. Por que estava dando entrada num visto de residente? Por que eu queria (voltar a) morar no país? De forma natural, as respostas foram surgindo e me fizeram perceber que o Japão também era laço, afeto, ajuda e confiança.

Alguns dias depois que eu soube do resultado, fui convidada para participar de uma viagem a Yokokusa, ao sul de Tóquio, com um grupo de membros da Japan Travel, um portal de turismo do qual sou colaboradora. Terminamos o primeiro dia de passeios num bar de estilo americano (a cara da cidade), onde puxaram um brinde: “parabéns para a Piti, que acabou de conseguir seu visto de residente!”. E aquele grupo, cuja maioria das pessoas eu tinha acabado de conhecer, só me fez reforçar um sentimento: o Japão é, também, onde eu me sinto em casa.

A todos que me apoiaram nesse processo e a todos vocês que me acompanham: MUITO obrigada. Espero que com este texto vocês tenham conseguido ter uma pequena noção do que tudo isso representa para mim.

Pelas ruelas de Kagurazaka, um dos meus bairros preferidos em Tóquio (Foto: Bruna Luise)

As fotos são de autoria da queridíssima Bruna Luise, que faz ensaios bem maravilhosos em Tóquio. A saia é da Tsubaki Vintage, que já foi tema deste post.