São várias as expressões japonesas que têm origem no Zen Budismo e que trazem ensinamentos profundos. Segundo o ilustrador Angelo Mokutan, autor do blog Tudo Zen?, Nichinichi kore koujitsu (日日是好日) pode ser entendido como: “aceitar o dia de hoje como um bom dia”. No blog, o mangaká (artista que cria mangás, os quadrinhos japoneses), explica melhor:
“Somos muitos os que vivem reclamando do tempo: “que calor!” no verão, ou “que tempo ruim!” quando chove.
Ao invés disso por que não olhar o lado bom? Por exemplo: quando chove as plantas ficam vitalizadas e a cidade cinza fica mais verde.”
Com exemplos assim, de fácil entendimento, e usando como suporte os quadrinhos no estilo japonês, o artista mineiro se propõe a disseminar ensinamentos do Zen Budismo aos brasileiros. Tratando de temas como meditação, autoconhecimento e relações humanas, o blog é atualizado regularmente com “drops” da filosofia japonesa, tornando simples o acesso do público geral a conceitos que poderiam ser considerados bastante complexos.
Curiosa para saber mais sobre seu trabalho, Angelo Mokutan me recebeu em seu estúdio-residência em Tóquio para uma entrevista que acabou se tornando uma verdadeira aula. Além de ouvir detalhes sobre a sua carreira como autor de mangás no Japão, pude aprender melhor sobre os fundamentos do Zen – assunto que já pipocou por aqui, neste post.
A trajetória de um mangaká brasileiro no Japão
Angelo Mokutan, que há 13 anos mora no Japão, começou a ter contato com a filosofia oriental dentro de casa, durante sua infância em Belo Horizonte, onde nasceu. Termos como yin-yang são conhecidos de longa data, já que sua mãe, médica, interessada em aprender sobre medicina chinesa, tornou-se discípula de um monge zen budista. Do seu pai, o escultor Ricardo Carvão, herdou a inclinação pelas artes e também a inspiração para seu nome artístico: Mokutan, que significa “carvão” em japonês.
Com sua aptidão para o desenho e a paixão pelas animações japonesas que acompanhava na adolescência, ainda bem novo, Angelo decidiu que se tornaria um mangaká. Só para vocês terem uma ideia da dimensão do mercado aqui, numa comparação que o próprio artista faz, esse sonho seria ao equivalente a um japonês querer ser jogador de futebol profissional no Brasil. Fácil 😛
Para realizar seu objetivo, Angelo chegou no Japão em 2006, como bolsista de um programa do MEXT, o Ministério da Educação, Cultura, Esporte, Ciência e Tecnologia. Depois do mestrado em desenho animado pela Universidade Zokei, em Tóquio, passou a produzir obras para publicações e exposições, paralelamente ao trabalho fixo numa empresa de tecnologia. Mesmo enfrentando uma série de dificuldades, principalmente de ordem cultural, conseguiu se estabelecer no Japão como mangaká profissional. Tanto que, em 2015, passou a se dedicar exclusivamente aos quadrinhos e a outros trabalhos como desenhista.
Com a publicação da obra “A Condenação de Leonora às Bestas” (tradução do original em japonês), Angelo Mokutan conquistou uma proeza: tornou-se o primeiro brasileiro sem ascendência japonesa a publicar um mangá no concorridíssimo mercado japonês.
Os fundamentos do Zen
Angelo me explicou que adotar a filosofia oriental no dia-a-dia vai além de entender palavras e ideias. Trata-se de uma filosofia prática, que depende essencialmente de cada um, sem a necessidade de mestres ou instituições.
No rumo pela descoberta da nossa essência e daquilo nos faz bem, é importante experimentar e observar as consequências. Um exemplo bem simples que Angelo deu e que pode se aplicar à vida de qualquer um foi sobre alimentação. Hoje em dia, temos acesso a tanta informação sobre comidas saudáveis e sobre o que faz bem ou mal, que às vezes ficamos perdidos na dieta que devemos seguir. Seguindo a filosofia Zen, para saber mesmo, nada melhor do que experimentar e ver a reação do nosso corpo.
Além dessa questão das vivências práticas, outro ponto importante que o mangaká levantou é a análise objetiva das situações. É interessante entender que análise objetiva, aqui, não significa lógica. Tanto a lógica quanto as emoções podem atrapalhar uma avaliação clara e profunda das coisas. E, para ajudar a clarear o que está sendo bloqueado por emoções e excesso de raciocínio lógico, a meditação pode ser adotada como uma prática para enxergar situações com mais objetividade e dar mais margem à intuição. Sobre essa questão, recomendo a leitura desse post, em que Angelo fala sobre o termo “Honshin”, que pode ser entendido como “ver-se de fora de si mesmo”.
Difundindo o Zen no Brasil com a linguagem de mangás
Em seu próximo projeto, Angelo Mokutan vai publicar mangás sobre a filosofia Zen no Brasil, de forma semelhante à que vem fazendo no blog: com uma linguagem simples e divertida, ao mesmo em que transmite conceitos profundos que podem melhorar o dia-a-dia dos leitores.
Nesse contexto em que o conhecimento não deve ficar limitado a palavras, o ilustrador acredita que abordar o Zen em desenhos pode aumentar a possibilidade de conhecimento da filosofia.
Se quiserem acompanhar as próximas etapa desse projeto e saber mais sobre Zen Budismo, fica aqui a dica: acompanhem suas atualizações no blog e também em seu perfil no Instagram, @mokutan_angelo.