Estava num churrasco na beira do rio Tamagawa, quando ela chegou. Toda sorridente, falando com todos que encontrava, não demorou muito para que ela se aproximasse de mim para perguntar se eu já tinha comido alguma coisa. Para minha surpresa, Ruka não conhecia ninguém de lá e, sozinha, resolveu aparecer porque tinha achado interessante o convite do evento no Facebook. Para surpresa dela, eu disse que não era japonesa e dei aquela explicada básica sobre as minhas origens.

Enquanto a galera se entretinha com um frisbee e com uma bola, eu, que não sou muito dada aos esportes coletivos, aproveitei pra fazer uma caminhada com a Ruka. Nascida em Sapporo, capital de Hokkaido, já fazia alguns anos que morava em Kanagawa, perto de Tóquio. Ficou interessadíssima em saber mais sobre mim e o Brasil, me fazendo várias perguntas. De comida, comportamento, família, passando por problemas sociais e belezas naturais, nenhum assunto escapava aos ouvidos curiosos da minha mais nova amiga.

Ela aproveitou para dividir comigo seu aborrecimento com os padrões de beleza japoneses – em que as meninas devem ser absurdamente magras – e me contou do término do namoro com um sueco, que tinha partido para Nova York. Trocamos figurinhas sobre namorar pessoas de outros países, falamos sobre o ritmo de trabalho no Japão, e assim a conversa fluía enquanto continuávamos nossa caminhada.

Não sei exatamente por quanto tempo andamos, mas foi o suficiente para não vermos mais nenhum sinal do churrasco, do frisbee, nem da bola. Com toda essa troca, fiquei feliz de ver que nossas barreiras linguísticas (eu com o japonês e ela com o inglês) não foram o bastante para impedir nossa comunicação. Tendo boa vontade e bastante curiosidade, a gente consegue entender e se fazer entender.

Dali a uma semana seria minha despedida do Japão, depois de uma temporada de 40 dias. Chamei a Ruka para o combo “piquenique no parque Yoyogi + karaokê em Shinjuku” que eu estava marcando com alguns amigos, mas, pena, ela já tinha planos. De qualquer modo, tentaria dar uma passada para me falar tchau.

E não é que ela deu um jeito e realmente apareceu? Já estava escuro no parque e, enquanto recolhíamos as toalhas do gramado e separávamos o lixo, ela surgiu: “Piti! Que bom que você ainda está aqui! Fiquei preocupada de não te encontrar”.  Nas mãos, ela trazia alguns presentinhos para mim: um pacote de papéis japoneses e um par de brincos com pingentes em formato de tsuru, a ave japonesa que simboliza felicidade, boa sorte e saúde. Que fofura <3

Deixamos o parque e tomamos todos juntos o trem em direção a Shinjuku, rumo à noite de cantoria. Mas, na porta do karaokê, Ruka veio se despedir: “Eu vim só para te desejar boa viagem. Daqui, tenho que ir direto para um outro evento”.

Oi? Jura mesmo que ela tinha aparecido no Yoyogi à noite e pego a linha Yamanote pra descer na estação de Shinjuku lotada só pra acompanhar a gente e poder me falar tchau? E ainda teve a consideração de me levar presentinhos?  <3 <3 <3

Os japoneses sempre me pareceram bem sérios quanto ao valor de sua palavra. Se a gente fala “vamos marcar qualquer dia desses”, eles logo consultam a agenda para ver quando estão livres. Se eles dizem que vão te ajudar com alguma coisa, é muito difícil eles te decepcionarem. E, depois de ver a Ruka procurando por mim na escuridão do parque, vi que  o “vou tentar dar uma passada” realmente vale ouro, mesmo vindo de uma amizade construída em um único dia 😀